Brooklyn, Nova Iorque
Filipe Consciência
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Filipe Consciência
Filipe Consciência
Desde o encerramento do restaurante Alma, de Henrique Sá Pessoa, em Santos que ansiava pela reabertura do mesmo. Foram muitas as vezes em que procurei nas redes sociais e internet por informações sobre o novo projeto, mas tudo o que encontrava era que o Alma ia reabrir, só não se sabia quando.
Quando saiu, finalmente, a notícia de que já havia local e data prevista, vibrei com a ideia de poder voltar a um restaurante de Henrique Sá Pessoa (sem contar com o Cais da Pedra, sobre o qual já escrevi aqui), e não demorei muito a fazer a reserva para uma mesa.
Só entre nós, as expectativas não podiam ser maiores. Henrique Sá Pessoa é um dos melhores Chefs nacionais, a nova localização prometia e as primeiras pessoas a provar os pratos teceram os maiores elogios.
Por isso, quando cruzei as portas do novo Alma, estava convicto que ia ter uma das refeições do ano. E, o melhor de tudo, é que as expectativas até foram ultrapassadas.
Comecemos pela localização - Rua Anchieta, no prédio da "Vida Portuguesa" e tendo como vizinhos o "Largo" e o "Belcanto". Dificilmente poderia haver melhor localização e vizinhança. Valeu a pena o tempo de espera para conseguir arranjar um lugar assim. Até porque é esta mesma localização que permite que o restaurante tenha uma aura diferente, com um pé direito alto e colunas e arcos em pedra.
A decoração, simples e elegante, ficou espetacular. Nota para as maravilhosas mesas de madeira, para as bonitas cadeiras (apesar de ligeiramente desconfortáveis), para os candeeiros e grande "garrafeira", à vista de todos, tal como a cozinha, com a mesa de empratamento virada para a sala.
Tudo está lindo, sem esquecer os pormenores do serviço (Cutipol) e dos copos.
A juntar a um espaço tão elegante, nada melhor do que um bom serviço. Todos os empregados foram extremamente simpáticos e educados, mostrando-se disponíveis para esclarecer dúvidas e primando sempre pelo cuidado ao dispor os talheres na mesa e servir os pratos. Não é perfeito, e percebe-se que ainda tem de amadurecer um pouco, mas parece ir pelo bom caminho.
Passando à comida, por agora só são servidos jantares, mas está prevista a abertura do Alma para almoços já em dezembro. Tanto existe serviço à carta, como menus de degustação, tendo, para esta primeira vez, optado pela carta (interessante, com boa variedade e preços expectáveis).
Antes das entradas, foi servido o couvert. E posso desde já adiantar que este foi dos melhores couverts que alguma vez provei. Henrique Sá Pessoa confessou recentemente que o couvert era um dos "problemas" do antigo Alma, por isso esmerou-se neste. E, quanto a isso, não temos qualquer dúvida, sendo o novo couvert do Alma apenas semelhante (em qualidade e segundo a nossa experiência) ao servido no Roca Moo, dos irmãos Roca, em Barcelona.
A primeira parte do couvert (magnificamente apresentado num tabuleiro feito à medida) é composto por um:
Crocante de tapioca com chouriço de porco preto - tão bonito quando estaladiço e delicioso.
Brandade de bacalhau com sabores de castanha - não só fez recordar o Roca Moo, em Barcelona, como nos deixou rendidos ao sabor e textura da brandade. Melhor era impossível.
Macaron de cacau e foie gras - a prova de que até pessoas que nem conseguem conceber a ideia de comer foie gras (caso da minha querida mulher) podem adorar pratos com foie gras, e como, afinal, o chocolate combina com foie gras. Perfeito.
Depois de tamanha perfeição, seguiu-se uma tempura de pimentos vermelhos assados para molhar num coulis também de pimentos assados. Surpreendente, crocante, suave e intenso.
Ainda não refeitos de tamanha qualidade, foi servido um azeite extra virgem, Alma, de Beja e uma incrível manteiga fumada, para acompanhar dois tipos de pão - broa de milho e pão de Mafra - que apenas pecaram pela pouca variedade.
Num restaurante como o Alma, eram expectáveis, pelo menos, quatro tipos de pão, sendo que alguns deveriam ser mais elaborados. Não me refiro a um pão de plâncton, mas algo com frutos secos ou azeitonas resultaria bem. Não é nada de grave, mas esta é a altura certa para acertar alguns pormenores.
Para entradas, escolhemos:
Cenouras assadas, queijo de cabra, bulghur de frutos secos, azeite de cominhos €16,00
Canneloni de sapateira e salmão, sabayon de marisco, estragão e salicórnia €17,00
E aqui a perfeição desvaneceu-se. Pelo menos para a minha mulher, que não conseguiu comer o prato das cenouras, devido aos intensos sabores relembrando a cozinha marroquina, nem os canneloni, por serem demasiado enjoativos, motivando a vinda do Chef (não o Chef Henrique, que naquela noite estava em terras algarvias) à nossa mesa. Depois de querer entender o porquê da recusa em comer os pratos, pediu muitas desculpas e disponibilizou-se para trazer uma nova entrada, que agradecemos, mas recusámos. Atitude certeira e mais do que louvável.
Mas se a minha querida mulher não gostou das entradas, já eu adorei. As cenouras (que não tinham um sabor muito intenso), combinavam lindamente com o intenso queijo de cabra e com o "exotismo" do bulghur de frutos secos. Muito bom.
Por sua vez, o recheio dos canneloni de sapateira e salmão era muito saboroso (apesar do sabor do salmão ficar ligeiramente anulado), e o sabayon de marisco era do outro mundo. Podiam trazer-me um copo de sabayon que eu bebia com gosto.
Após alguma desilusão, tudo voltou a ficar bem com os pratos principais.
Calçada de bacalhau, puré de cebola, gema de ovo, €25,00 - mais uma reintrepretação do bacalhau à Brás, com um "Brás" de bacalhau sobre o qual repousava uma gema cozida a baixa temperatura (para rebentar pelo cliente), tapada por finas fatias de bacalhau e apontamentos de azeitona, fazendo recordar a tão típica calçada portuguesa.
A acompanhar, um puré de cebolada e um gel de salsa. Todos os ingredientes certos, num prato excelente.
Entrecôte de novilho, mousseline de aipo, pickle de beterraba, molho barbecue, €27,00 - o rei deste prato era o entrecôte de novilho, servido no ponto e com um sabor intenso, que deixava água na boca. A mousseline de aipo (muito agradável) e os pickles de beterraba conferiam um toque certo ao prato.
Como pré-sobremesa, e limpa palatos, foi servido um incrivelmente saboroso e refrescante gelado de manjericão, acompanhado por uma fatia de ananás desidratado, esferas de ananás macerado e folhas de poejo.
Para terminar em beleza, uma tarte Tatin de pêra em mil folhas, que antes de ser servida vai ao forno por oito minutos e é acompanhada por um gelado de baunilha e cardamomo, €10,00. Deliciosa.
Houve ainda espaço para uma Bomba de chocolate e caramelo salgado com sorvete de avelã, €12,00. A bomba é uma espécie de mousse de chocolate negro, com um recheio de caramelo salgado. O segredo, é combinar tudo no prato. E o resultado é de ir ao céu.
Como nota final, não podia deixar de mencionar a beleza de todos os pratos. Dá gosto comer pratos tão bem apresentados e com sabores tão incríveis. A continuar assim, aposto numa estrela já no próximo guia Michelin.
Pontuação de 0 a 10
Cozinha (50%) - 9,8
Serviço (25%) - 8,8
Ambiente (25%) - 9,4
Pontuação final - 9,45
Filipe Consciência
Para terminar a semana inteiramente dedicada à Osteria Francescana, eleita o segundo melhor restaurante do mundo, não podiam faltar as votações:
Pontuação de 0 a 10
Cozinha (50%) - 9
Serviço (25%) - 9,7
Ambiente (25%) - 9,5
Pontuação final - 9,3
Pontuação de 0 a 10
Cozinha (50%) - 9,4
Serviço (25%) - 9,8
Ambiente (25%) - 9,4
Pontuação final - 9,5
Perfazendo uma nota final de 9,4.
Esperamos que tenham gostado desta semana. Aqui ficam os links para todos os posts:
Semana da Osteria Francescana
- Como chegar a Modena, Itália
- Reservar mesa na Osteria Francescana
- A arte na Osteria Francescana
- Memórias de uma sandes de mortadela
- Cinco idades de Parmigiano Reggiano
- Beautiful, Psychedelic Spin Painted Veal, Not Flame Grilled
- Oops! I dropped the lemon tart
- Never Trust a Skinny Italian Chef
Filipe Consciência
Não só de boas ideias vive o homem. Esta é, para mim, a frase que melhor define aquilo que senti no fim da refeição no segundo melhor restaurante do mundo.
Massimo Bottura é, reafirmo, um verdadeiro génio (aconselho seriamente o episódio sobre ele da Chefs Table, disponível no Netflix). A sua capacidade para olhar para um prato tradicional e desconstruí-lo, dando-lhe uma roupagem completamente nova, despertando novos sabores, texturas e sensações, é incrível. Não é qualquer um que consegue transpor para um prato tantas ideias e loucuras, revolucionando a gastronomia italiana.
Porém, mais importante do que a criatividade, apresentação e beleza do prato, é o sabor. E se no resto tudo era perfeito, no sabor de alguns pratos Massimo Bottura falhou.
Quando vamos a um restaurante, em princípio preferimos comer algo menos bonito, mas delicioso, do que algo lindo, mas com um sabor bastante inferior. Mas a verdade é que é possível encontrar uma harmonia entre criatividade, apresentação e sabor.
Considero que já tenho alguma experiência neste mundo dos melhores e mais estrelados restaurantes do mundo, e sei que existem Chefs que conseguem alcançar grandes sabores, sem esquecer a criatividade - lembro-me, por exemplo, de Eneko Atxa, Chef do Azurmendi, 19º melhor restaurante do mundo, sobre o qual escrevemos aqui.
Massimo Bottura acertou, na perfeição, nos sabores do crocantino, da enguia, da carne e do parmesão em cinco texturas, temperaturas e idades. Mas e a parte crocante da lasanha? E a Caesar salad? E a torta de riso? E a tarte de limão?
Alguns, possivelmente muitos, não concordarão. Afinal, a Osteria tem três estrelas e está em segundo lugar no ranking mundial de restaurantes. Mas se fosse para avaliar o restaurante de acordo com os seus prémios, não precisava de sair de casa.
Se foi o melhor restaurante onde já estive? Não. Já tive melhores refeições e experiências, tanto em Portugal como no estrangeiro.
Se valeu a pena ir à Osteria? Sim, muito. Conheci o segundo melhor restaurante do mundo, concorde-se ou não, conheci pessoalmente o Massimo Bottura, experimentei pratos incríveis, mesmo que alguns só em apresentação, e conheci a bela cidade de Modena.
Semana da Osteria Francescana
- Como chegar a Modena, Itália
- Reservar mesa na Osteria Francescana
- A arte na Osteria Francescana
- Memórias de uma sandes de mortadela
- Cinco idades de Parmigiano Reggiano
- Beautiful, Psychedelic Spin Painted Veal, Not Flame Grilled
- Oops! I dropped the lemon tart
- Never Trust a Skinny Italian Chef
A ideia de irmos a Modena e ao segundo melhor restaurante do mundo surgiu assim de repente, e meio ao acaso, em pleno verão, já depois de termos o nosso bebé. Curiosamente, foi possível fazer a reserva para novembro, altura em que era possível tirarmos uns dias de férias para visitarmos uma cidade europeia e levarmos o bebé connosco. Convenhamos que na altura não pensámos lá muito bem se seria fácil ou não levar o bebé a um destes restaurantes. Mas depois de, ainda com 2 meses, termos decidido fazer um périplo por três bons restaurantes do norte de Portugal com ele ao colo (a dormir) ou no carrinho (ora a rir, ora a chorar), concluímos que não seria fácil aguentá-lo bem disposto durante três horas num restaurante de tão alto nível. Mas enfim, a reserva estava feita, eles aceitavam bebés e nós lá fomos.
Para começar, Modena. Só para conhecer esta bela cidade italiana, já valeria a pena ir à Osteria Francescana. É mais uma cidade encantadora em Itália, com uma arquitetura fabulosa, igrejas encantadoras e muitos recantos charmosos. Claro que um dia de sol em pleno outono também ajudou.
O restaurante fica numa rua estreitinha, num prédio antigo pintado de cor de rosa, como muitos outros edifícios na cidade. Quando chegámos vimos o Chef na rua a participar de uma gravação de mais um (provável) documentário a seu respeito. À porta, um carro preto de alta cilindrada que presumimos ser dele. Fomos até ao fundo da rua fazer tempo (chegámos uns minutos antes da hora) e, de repente, vemos chegar três orientais que tocaram à campainha. Aproveitámos a boleia e entrámos.
Mal entrámos, para não variar, o nosso bebé acordou. Todo o staff foi de uma enorme simpatia para connosco e o nosso bebé durante o almoço.
Das três ementas possíveis, escolhemos os clássicos. Sobretudo por ter menos pratos e, por isso, demorar menos tempo a ser servido. Eu sempre com medo que o bebé se fartasse e começasse a chorar, numa sala muito pequena, onde as outras quatro mesas estavam cheias...
Sinceramente, se dependesse de mim, este restaurante nunca seria o segundo melhor do mundo. Não houve nada na ementa que me fizesse querer voltar. Nada que me tenha provocado uma paixão avassaladora. Nada que me tenha encantado de verdade. Gostei muito dos grissini e da carne. Tirando isso, o resto comi por comer, sem ter apreciado muito, ou então não gostei mesmo e dei ao meu marido ("gelado" de foie gras e Caesar salad).
O que eu gostei mesmo foi da apresentação e da criatividade. Nisso, de facto, parece-me que este Chef é ímpar. Mas nos sabores ficou muito aquém das minhas expectativas...
Gostei do Chef, que veio à mesa e foi muito simpático, sobretudo para o bebé (que, verdade seja dita, e com muito esforço nosso para o distrairmos, se portou exemplarmente!).
No final, soube a pouco. Acho que por ser o segundo melhor do mundo e por ser em Itália, esperava muito mais!
Semana da Osteria Francescana
- Como chegar a Modena, Itália
- Reservar mesa na Osteria Francescana
- A arte na Osteria Francescana
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