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Filipe Consciência

Filipe Consciência

27.06.19

Se for a convite vou adorar. Se não for...


Filipe Consciência

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Recentemente contaram-me uma história sobre uma pessoa bem conhecida da nossa praça que faz críticas a restaurantes. Conta a história que essa pessoa foi até um restaurante de Lisboa e, no fim da refeição, ficou muito revoltado por lhe terem apresentado a conta.

 

Até aí tudo bem. Eu, que não passo de um iniciante nestas artes, também fico transtornado sempre que no fim da refeição me apresentam a conta. Onde é que já se viu pedirem-me para pagar no fim de um almoço/jantar? Eu sou o Filipe Consciência!! Ou sou convidado para ir a restaurantes, ou quando decido ir a um restaurante por livre iniciativa, o mínimo que espero é não pagar um cêntimo! (momento irónico, ok?)

 

Depois de alguma "discussão", a pessoa teve de pagar a conta, para sua grande tristeza. E o que é que aconteceu uns dias depois? Aparece um artigo a desancar o restaurante. Aposto o que quiserem que se ele não tivesse pago a conta, seguramente não haveria aquele artigo tão forte. Ou pelo menos seria bem mais suave.

 

Mas este é apenas um de muitos casos de pessoas que se comportam mais ou menos da mesma forma. Se for a convite, está tudo bem. Melhor restaurante do mundo. Se não for convite, então lá vem a crítica. 

 

Ou não sou nenhum bicho estranho, e conheço vários gastrófilos e críticos que se comportam como eu. Eu vou a vários restaurantes a convite, mas não sou influenciado por isso. Quando eu digo que é bom, é porque para mim é verdadeiramente bom. Já fui a convites e critiquei, sempre de forma construtiva, no blog e redes sociais. Já perdi "parcerias" por causa disso mesmo e já recebi várias mensagens privadas, mas nunca deixarei de o fazer.

 

Recordo-me com frequência de um restaurante em Lisboa que me convidou e, à chegada, a responsável pela comunicação disse-me: "este almoço é oferecido, mas vai ter de escrever que é o melhor restaurante de Lisboa, está bem?" Só não saí imediatamente porque a senhora pediu logo desculpa quando disse que sendo assim não almoçava. Por acaso a comida era verdadeiramente boa. No final critiquei publicamente um prato por achar que poderia estar melhor e depois ainda fui convidado a voltar.

 

Estas visitas a restaurantes devem ser vistas não só como um meio de publicitar os espaços, mas também como uma forma de se ter um feedback com maior know how sobre o trabalho feito. Por norma os restaurantes até respondem positivamente às críticas. E é isso que é natural.

 

Para que serve afinal fazer críticas a restaurantes? Não é para partilharmos as nossas experiências e recomendarmos (ou não) a outras pessoas? Então de que é que adianta dizer que está bom quando está mau? Só por pura malvadez. É que ir a um restaurante implica perder tempo e gastar dinheiro. A não ser para pessoas especiais, claro.

 

Às vezes perguntam-me como é que eu posso dizer que determinado prato de um restaurante "normal" estava tão bom, quando eu tenho uma grande experiência em restaurantes estrelados. E eu, depois de respirar fundo umas vezes, lá respondo que eu não estou a comparar experiências e realidades incomparáveis. Cada restaurante insere-se numa categoria. Numa espécie de classe. A análise a esse restaurante deve ser feita com base em restaurantes similares. Restaurantes dentro da mesma classe. 

 

Eu não vou à tasca na rua ao lado do meu escritório comer um prato e fazer comparações com o que comi no Feitoria! Não vou ao Cantinho do Avillez, ou à Pizzaria Lisboa, e sair de lá a dizer: "esperava muito mais depois de ter ido ao Belcanto" (há tantas críticas destas...). Cada macaco no seu galho.

 

Por isso ir a um restaurante "normal" a convite e sair de lá a dizer que tive uma refeição espetacular, não quer dizer que é o melhor restaurante de Lisboa, nem que é melhor do que os estrelados, nem que só o estou a escrever porque fui a convite. Quer apenas dizer que foi espetacular para o que era expectável naquele restaurante. Se for melhor do que os estrelados, ou se for mesmo o melhor de Lisboa, eu escreverei sem qualquer problema!

 

Recentemente fiz um top de restaurantes preferidos no Instagram, onde não constavam estrelados, e ainda recebo um comentário muito admirado. Mas eu só posso gostar de restaurantes com estrelas e que ficam bem no feed das redes sociais??

 

Voltando à parte inicial, é uma perfeita estupidez um famoso ou um influenciador andar a "choramingar" por refeições gratuitas, mas ainda é pior no final virem com vinganças, pondo em causa um negócio que envolve várias pessoas só porque o seu ego (e carteira) foram feridos. E é igualmente uma estupidez dar falsas opiniões para agradar chefs, empresas ou restaurantes e com isso conseguir mais convites.

 

Fica o desabafo.

26.06.19

Restaurantes que saíram da lista dos 50Best


Filipe Consciência

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Ontem recebi diversas mensagens de pessoas a perguntar onde estava o Celler de Can Roca ou a Osteria Francescana na lista ontem divulgada dos The World's 50 Best Restaurants 2019.

 

De forma controversa, este ano não foram a votação os vencedores de edições anteriores da lista dos 50 melhores do mundo, que passaram a constar de uma espécie de Hall of Fame designado de Best of the Best.

 

Ou seja os seguintes restaurantes:

El Bulli (2002, 2006-2009)

The French Laundry (2003-2004)

The Fat Duck (2005)

Noma – localização original (2010-2012, 2014)

El Celler de Can Roca (2013, 2015)

Osteria Francescana (2016, 2018)

Eleven Madison Park (2017)

Não poderão mais constar da lista dos 50 Best, com a ainda mais controversa exceção do Noma, que entrou disparado para a 2ª posição da lista de 2019. Segundo entendimento da organização, como mudou de espaço e, mais ou menos, de conceito, foi considerado que era um novo restaurante e como tal pode ser votado.

 

O porquê disto ter acontecido tem dado origem a várias divagações. Há quem defenda que esta decisão dos Best of the Best serve para dar lugar a outros, evitando monopólios, mas também há quem esclareça que tudo se deve ao facto dos Chefs, que anteriormente estiveram em primeiro lugar, estarem desanimados / tristes / zangados por já não estarem na liderança. Ou não estarem de todo na lista, como o The Fat Duck. 

 

Seja para não diminuir o ego dos Chefs, ou mesmo para dar lugar a outros (em 14 anos a liderança tem sido partilhada por 5 restaurantes) que sentido é que faz deixar de dar oportunidade a um restaurante que já foi o primeiro, de voltar a ser o primeiro?

 

Exemplo simples: O Eleven ganhou em 2017. E agora nunca mais pode ganhar. O Mirazur ganhou ontem e ponto final. Mas isto faz algum sentido? O Benfica ganha um ano e acabou? Muitos ficam contentes, mas não me parece lógico.

 

E depois para ajudar, o Noma, que é o mesmo Noma (não me venham com tretas) pode ganhar outra vez. E vai ganhar. Para o ano é limpinho.

 

Sugestão para o Heston Blumenthal - muda o The Fat Duck do sítio feio onde está (a meu ver) para o Hind's Head que já é teu e é mesmo ao lado, e assim já podes ir a votos novamente. Easy!

25.06.19

Mirazur – Eleito o melhor restaurante do mundo


Filipe Consciência

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Sem grandes surpresas, o restaurante Mirazur acabou de ser eleito o melhor restaurante do Mundo de acordo com a conceituada lista dos The World’s 50 Best restaurants. Escrevo sem grandes surpresas porque saiu da lista a Osteria Francescana e El Celler da Can Roca (estavam em 1º e 2º lugar respetivamente em 2018) e seria normal que o 3º lugar em 2018 subisse ao pódio agora em 2019. Mas também não foi para mim uma surpresa por causa da tremenda experiência que tive no Mirazur há 2 meses.

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Já vai longa a lista de restaurantes visitados, com e sem estrela Michelin, e a visita ao Mirazur foi sem dúvida uma das melhores. Pelo espaço, pelo serviço (ao mais alto nível) e essencialmente pelo menu de degustação servido. Tudo maravilhoso, desde a apresentação imaculada ao sabor geral que deixava sentir a riqueza dos produtos (locais e muitos de km 0) não ocultando nada.

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Podem acompanhar toda a refeição ao pormenor no meu Instagram.

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No final da refeição, tive a oportunidade de ir conhecer e falar sem pressas com o Chef Mauro Colagreco que demonstrou ser como o seu restaurante - sem snobismos, manias de grandeza, muito simples e simpático. Falando sempre em Português, fez-nos sentir em casa. Uma casa que agora é considerada a melhor do mundo.

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Parabéns Mauro, parabéns equipa do Mirazur!

21.06.19

“Portugal merecia uns 100 restaurantes com estrela"


Filipe Consciência

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Quando escrevo sobre o reduzido número de restaurantes com estrelas Michelin em Portugal, "chovem" comentários de pseudo entendidos a explicarem-me, como se fosse burro, que nós não temos restaurantes com tanta qualidade, que não nos podemos comparar, muito menos com os espanhóis, que não temos uma grande quantidade de restaurantes de qualidade...

 

Quando escrevi que o Euskalduna merecia duas estrelas, levei logo com "Nem uma pode levar. Com balcão? Sem serviço Michelin? Não percebes nada..."

 

Quando elogiei a Casa de Chá da Boa Nova e disse que merecia muito mais destaque do que tem e eventualmente duas estrelas, li em resposta comentários sarcásticos. 

 

Agora o Ferran Adrià veio a Portugal e disse:

“Portugal, o Governo português e as autoridades do turismo podem ter uma grande palavra a dizer neste campeonato. É preciso saber transmitir [essa identidade gastronómica] com a ajuda do marketing e da comunicação. Não podemos achar que vender o nosso país é algo feio. Só o é quando o fazem com mentiras.”

 

“A cozinha portuguesa tem produtos incríveis, melhores não existem, só iguais. O Japão não tem melhores produtos que a Península Ibérica. Isto é importantíssimo. Eu comi marisco português de nível dez!”

 

Casa de Chá da Boa Nova. O que achou sobre isso? “É o restaurante mais bonito do mundo. Todas as pessoas que amam a gastronomia têm de ir lá, é incrível, de fazer chorar. Carta de vinhos extraordinária, serviço de três estrelas e  comida fantástica. O Rui Paula é fantástico. Este sítio tem uma estrela mas facilmente teria duas.”

 

Sobre o Euskalduna — “Um restaurante de comida de autor onde se come ao balcão? Isso era impensável de existir no Ocidente há 20 anos.” — foi dos que mereceu elogios mais rasgados: “Fomos ao Euskalduna e aquilo está a um nível de duas estrelas [Michelin], sem qualquer discussão. Tudo português, ainda por cima.”

 

“Eu abriria já amanhã pelo menos dois conceitos aqui em Portugal. Estou reformado e tal mas se quiserem montar um negócio comigo… [risos]. Um seria de tempura… Por favor! O governo que pague a um rapaz ou a uma rapariga para fazerem um sítio de tempura em Portugal! O outro seria uma  marisqueira de autor, como o Elkano [famoso restaurante no País Basco] com especiarias. Da mesma forma que se põe sal, púnhamos um pouco de caril, por exemplo.”

 

Para terminar:

O antigo chef do elBulli explica que por muito que seja importante ter noção de que todos os países têm de ter um “limite” de restaurantes de topo (“Uma cidade não consegue suportar mais de 25 três estrelas”), Portugal está longe de chegar a esse máximo. “Quantos stands da Ferrari há em Lisboa?”, pergunta. “Dois”, respondeu-lhe uma cara na “plateia”, e Adrià ripostou de imediato: “Então deviam ter pelo menos dois três estrelas.”

“Quantos restaurantes gastronómicos, de máximo nível, podem haver em Portugal? 100?Quantos restaurantes estrelados há em Portugal? Uns vinte? Só? Mereciam, perfeitamente, uns 100. Pelo que vi, posso garantir-vos.”

 

Talvez ele também seja burro, por isso se os pseudo entendidos puderem explicar-lhe a "realidade"... É que ele, coitado, não conhece nada, não percebe nada deste mundo, nem entende como funciona.

 

Opiniões todos as devemos ter, mas se parássemos um pouco de criticar o que é nosso, só porque é nosso, e passássemos a lutar pela tremenda qualidade que temos, talvez fosse melhor. Mas eu não percebo nada disto, já sei. 

 

Excertos do artigo do Diogo Lopes no Observador.

14.06.19

Nunca poderei ir a um Michelin!


Filipe Consciência

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Ontem, na final da Supper Stars Battle, uma senhora da audiência disse-me que tinha muita inveja porque nunca poderia ir a um restaurante com estrela Michelin só a restaurantes "normais". Poucos minutos depois, curiosamente, o apresentador do concurso, Miguel Braga, pediu-me para explicar à plateia como é que conseguia ir a tantos restaurantes Michelin.

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Este é um assunto que já debati anteriormente e que no fundo é bem mais simples do que parece a muitos. Eu poderia fazer a mesma pergunta às pessoas que vão sucessivamente a jogos de futebol. Ou a concertos. Ou aos que estão sempre a comprar mais uma peça de roupa. Ou mesmo aos que vão periodicamente a restaurantes que não são Michelin.

 

Afinal de contas, não canalizamos todos as nossas poupanças para aquilo que mais gostamos? Eu gosto mais de viajar e ir comer a bons restaurantes (sejam eles Michelin ou mais banais), por isso o meu dinheiro extra vai para aí.

 

E a ideia de que ir a um restaurante Michelin significa ficar com a carteira vazia, não podia ser mais enganadora. Ainda ontem dei o exemplo do Eleven. Tem uma estrela Michelin, uma vista maravilhosa, ótimo serviço e comida sempre irrepreensível. Tudo, ao almoço no menu executivo, por 35€ por pessoa. É caro? Para muitos claro que sim, mas não é impossível.

 

Se, por exemplo, não forem almoçar fora todos os dias, têm esse dinheiro ao fim de uma semana (eu levo sempre comida de casa). Ou se não forem ao café tomar um segundo pequeno-almoço ou lanche, como tantos fazem. Ou se decidirem cortar no café, no tabaco, nas raspadinhas… Entre tantas outras coisas que, mesmo pequenas, fazem a diferença no fim.

 

Por isso não é impossível ir a um Michelin. Basta direcionar o dinheiro para o que se quer.

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